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04 mar 2018

Se vira nos 30

Você sabia que se as pessoas não estiverem prestando atenção em suas palavras, provavelmente, a culpa é sua?

Esta é uma regra que vale a pena considerar – salvo uma ou outra exceção, não existe ouvinte desinteressado, mas sim orador desinteressante.

Entendi, Polito. Devo ser interessante para atrair a atenção e manter a concentração dos ouvintes. Só preciso saber como agir e por onde começar.

Você já deve ter ouvido falar ou até ter assistido ao quadro “se vira nos 30”, levado ao ar no programa do Faustão pela Rede Globo de Televisão. Muita gente se inscreve para participar do programa e ter a chance de mostrar seus “excepcionais dotes artísticos”.

Em 30 segundos o candidato precisa se virar do jeito que puder para encantar um grupo de jurados e não ser gongado. Por isso, fazem de tudo, desde equilibrar os mais inusitados objetos, tocar sozinhos vários instrumentos estranhos de uma só vez, dançar de cabeça para baixo, assobiar e chupar cana.

O que a maioria dessa turma faz só por brincadeira, outros, no dia-a-dia, fazem para sobreviver – são os camelôs. De maneira geral, são pessoas com pouca ou nenhuma formação escolar, que passam o dia tentando reunir grupos de curiosos para vender o que cair em suas mãos.

Você talvez esteja pensando: mas, que raio de conversa esquisita é essa? Afinal, o que tem a ver o “se vira nos 30” com os camelôs e com o meu desempenho na arte de falar para conquistar o interesse dos ouvintes?

Pode parecer estranho, mas tem tudo a ver. Se você desejar ser bem-sucedido com a sua comunicação verbal, precisará aprender um pouco com cada um desses “guerreiros” que usam o que sabem fazer de melhor para dar seu espetáculo na tentativa de atingir seus objetivos.

É o espetáculo que torna o conteúdo atraente. Se você se preocupar apenas com o conteúdo da mensagem imaginando que só com esse ingrediente conquistará os ouvintes, corre o risco de estar enganado.

Observe os palestrantes que vivem com agenda tomada. Todos vão para o palco prontos para participar de um verdadeiro show. Provocam risos, arrancam lágrimas, mexem com as emoções dos ouvintes, fazem tudo o que podem para que plateia não fique desinteressada nem caia na apatia.

É assim também que os camelôs tocam seu trabalho. Precisam atrair a atenção das pessoas e seduzi-las para que comprem seus produtos. Se eles apenas se preocupassem em destacar as qualidades dos produtos que precisam vender, poderiam voltar para casa com as mãos abanando.

É questão de sobrevivência – ou vendem e garantem os trocados que necessitam para manter a família ou terminam o dia sem ter ao menos o que comer. Temos muito que aprender com esses heróis das ruas.

Certa vez participei de uma  matéria do Programa Vitrine da TV Cultura, sobre a atividade dos camelôs. Atuando como repórter fui até o centro velho de São Paulo para entrevistá-los e tentar descobrir um pouco sobre suas estratégias de comunicação. Fiquei surpreso e muito impressionado com o conhecimento que possuem sobre a arte de falar!

Um deles me contou qual a tática que utiliza para chamar a atenção das pessoas, que sempre passam apressadas. Ele usa a força da sua voz para pronunciar algumas frases de  impacto. Dessa forma os transeuntes ficam curiosos e param para ver o que está acontecendo.

Esse é um ótimo recurso para introduzirmos no nosso show. Especialmente nos casos em que os ouvintes estejam dispersos, alheios, desligados, algumas frases com informações que possam provocar impacto poderão deixá-los curiosos e interessados no que temos a dizer.

O segundo que entrevistei me disse que sua maior preocupação era com o comportamento e a reação das pessoas. Assim que percebia os primeiros sinais de desatenção, como, por exemplo, se passassem a olhar para o chão, para os lados, movimentar muito a cabeça, ou mudar com frequência o apoio do corpo ora sobre uma perna, ora sobre outra, estava na hora de contar uma história instigante, curiosa, para trazer o pensamento de volta.

Ele me confidenciou que nada poderia ser pior do que perder a atenção dos ouvintes. Por isso, se a história não funcionasse,  não hesitava em usar sua arma secreta – punha a Catarina na roda. Catarina era uma cobra enorme que havia sido treinada para fumar. Não dava outra, ninguém batia em retirada enquanto  Catarina dava suas baforadas.

Não tenha ilusões. Por melhor que seja sua mensagem, depois de algum tempo, entre cinco e dez minutos, o ouvinte cria um foco de atenção viciado e passa a ter dificuldade para se manter concentrado em suas palavras. Uma história curta, atraente na hora em que o público começa a perder a atenção, fará com que a platéia volte a se concentrar na mensagem.

Finalmente, a descoberta mais surpreendente. O terceiro camelô que entrevistei disse que depois da aplicação de toda essa estratégia – contar histórias engraçadas, fazer o público rir ou chorar, introduzia nas trincheiras adversárias os serviços do “agá”.

O “agá” atua como cúmplice do camelô. Ele fica no meio das pessoas como se fosse mais um  entre tantos interessados. No momento certo ele toma a iniciativa de maneira acintosa para comprar o produto do camelô.

Eu perguntei se essa atitude não poderia ser vista como uma trapaça. Ele não se mostrou ofendido com meu questionamento e respondeu com toda naturalidade: não se esqueça de que estamos em uma verdadeira praça de guerra e eu preciso vencer essa batalha. Acredito que um agazinho bem plantado não prejudica ninguém. É só uma isca para garantir o leitinho das crianças.

Analise o que você sabe fazer de melhor. Talvez você saiba fazer imitações. É possível que tenha habilidade para contar histórias. Quem sabe tenha o dom para cantar ou tocar algum instrumento. Vale também sapatear ou fazer mágicas. Aperfeiçoe o que já sabe fazer e se torne ainda melhor.

Durante a apresentação lance mão desses recursos para que façam parte do seu show. Se conseguir contextualizar bem essas inserções, elas poderão participar de maneira tão harmoniosa no conjunto da exposição que o resultado será muito positivo.

Quanto maior o público e mais inculto, maior a quantidade de espetáculo que você deverá utilizar. À medida que o tamanho da platéia diminui e o nível intelectual aumenta, menor também deverá ser o volume do show.

Entretanto, por mais bem preparados que sejam os ouvintes e por menor que seja o público você nunca poderá deixar de usar algum tipo de espetáculo. Afinal, os ouvintes serão sempre seres-humanos, e todos nós gostamos de receber o conteúdo de uma mensagem de forma atraente e estimulante.

Para que a sua mensagem seja bem-sucedida e você consiga as vitórias que deseja em suas apresentações deve lançar mão de tudo o que puder para dar o seu show. Precisa aprender a se virar nos 30 e a ser cativante como um bom camelô.

Tirando todos os excessos e exageros e guardadas todas as proporções devidas, esta pode ser uma boa proposta para que tenha ainda mais sucesso com a comunicação.

Superdicas da semana:

– Use em público as mesmas habilidades que o tornam interessante diante dos amigos;

– Aperfeiçoe o que já sabe fazer para dar um espetáculo ainda melhor;

– Seja ousado e não tenha receio de tornar sua apresentação leve e atraente;

– Teste as histórias, piadas e imitações antes de se arriscar diante da plateia.

Livro de minha autoria que trata desse tema “Como falar corretamente e sem inibições”, publicado pela Editora Saraiva.

 

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