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04 abr 2018

Você está preso às palavras?

Às vezes somos prisioneiros das nossas próprias palavras. Mesmo sem nos darmos conta, quase todos nós, de maneira mais ou menos acentuada, nos aprisionamos às palavras que proferimos. Por isso, vale a pena analisar essa importante questão.

Vamos refletir um pouco melhor a respeito do significado de muitas das tantas convicções que temos, certezas que contam nossa história de vida, uma narrativa incansavelmente tecida no dia a dia de nossa existência, para que possamos tomar consciência de que palavras são essas que podem nos aprisionar.

Quem tratou desse tema de maneira esclarecedora foi Walter Benjamin em “O narrador”: “Seu dom é poder contar sua vida; sua dignidade é contá-la inteira”.
Vamos considerar o “poder de contar sua vida” como sendo a experiência das diversas narrativas que somadas compõem nossa existência. E “contá-la inteira” a possibilidade de harmonizar o nosso interior com o mundo que nos cerca.

Trocando em miúdos: cabe a cada um de nós escolher como contar as nossas experiências e fazê-lo de forma positiva, vendo naquilo que vivenciamos o quanto crescemos, aprendemos e transformamos nossa existência. Como se pudéssemos viver diversas vidas, todas verdadeiras, mas com cores e nuanças diferentes.

Um bom exemplo de como é possível falar sobre o mesmo fato, ou a respeito da mesma pessoa de maneira completamente distinta são os debates políticos e o tribunal do júri. Um político fala de seu correligionário destacando as inúmeras virtudes e qualidades do candidato que defende, enquanto seu adversário, ao se referir à mesma pessoa, só vê defeitos e imperfeições.

O advogado de acusação, de maneira eloquente, faz um relato de todos os motivos que deveriam incriminar o réu, enquanto o advogado de defesa, com a mesma eloquência, se empenha em falar dos diversos pontos positivos que marcaram a vida do seu cliente. Talvez até todos tenham razão, pois dependerá sempre da maneira como a narrativa foi produzida.

O que demonstra que até sobre nós mesmos, ou a respeito das experiências que vivenciamos, haverá inúmeras formas de narrarmos as mesmas informações. Só que por nos aprisionarmos a uma visão única nem sempre conseguimos alterar a narrativa.

Somos a interpretação que fazemos do mundo. Como exemplo, mais cedo ou mais tarde talvez você tenha de atender a este pedido: ”Fale da sua experiência profissional”. Seja para conseguir um novo emprego ou para contar em uma entrevista como foi o sucesso da sua carreira.

Se você já passou por essa situação mais de uma vez, deve ter percebido que, provavelmente, contou sua história da mesma maneira. E, se tiver de contar outra vez, é quase certo que usará a mesma narrativa, valendo-se das mesmas circunstâncias, criando as mesmas expectativas e discorrendo a respeito dos mesmos desafios.

Você poderia contestar: – E o que há de errado em agir assim? Acho até interessante narrar um fato da mesma maneira, porque com esse recurso é possível afastar as informações indesejáveis e aperfeiçoar ainda mais aquelas que sejam positivas.

Você tem razão. Entretanto, a montanha possui vários lados, embora seja sempre a mesma montanha. Dependendo do seu posicionamento, verá a montanha de um jeito diferente, mas, se tiver de descrevê-la, independentemente do lado a que se refira, o tema da sua narrativa será o mesmo.

Exercitando contar sua experiência profissional de maneiras distintas você não irá mudar sua história, apenas aprenderá a descrevê-la por ângulos distintos. São nossas as opções, as escolhas das informações que tiveram significado na nossa vida. E dependendo da narrativa que adotarmos estaremos mostrando aos outros e a nós mesmos qual foi a interpretação que fizemos do mundo.

Ocorre que, de maneira geral, adotamos um viés de discurso e nos aprisionamos a ele, como se aquela forma de ver e encarar a vida fosse única, cristalizada e imutável – tornamo-nos prisioneiros das nossas próprias palavras.

Edgard Morin, na obra que escreveu com Jean-Louis Le Moigne, “Inteligência da complexidade” diz: “Nossas visões do mundo são as traduções do mundo”. Por isso, pela maneira como narramos os fatos que fizeram parte da nossa existência estaremos revelando também quem somos e como somos.

Não somos, entretanto, apenas uma coisa ou outra. A vida é muito mais ampla, aberta, repleta de experiências para as quais nem sempre atentamos. Habituamo-nos a dizer que somos de um determinado jeito e acabamos acreditando que somos mesmo sempre assim – “sou intolerante”, “sou rígido”, “sou desorganizado“. Sim, talvez até sejamos dessa forma algumas vezes, ou na maior parte do tempo, mas será que somos só isso?

Será que não seria possível recontar nossa interpretação do mundo, que no fundo faz parte da construção da nossa própria identidade, por prismas distintos, que conseguissem mostrar as outras facetas da vida mais abrangente que vivemos? Esse é um exercício possível que ajudará a nos libertar das palavras que adotamos para contar e recontar quem somos e como somos.

Superdicas da semana:

– Veja se não está reclamando da vida só por reclamar.

– Observe se você é mesmo como diz ser.

– Experimente contar de maneiras diferentes uma história conhecida.

– Reflita antes de responder mecanicamente a uma pergunta no dia a dia.

 

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Livro de minha autoria que ajuda a refletir sobre esse tema: “O que a vida me ensinou – para não deixar a conquista escapar pelos dedos”, publicado pela Editora Saraiva.

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