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26 abr 2024

Cuidado! Sexo frágil

por Reinaldo Polito

Parecia um sonho, eu ouvia aquela mulher falando e não acreditava.
Uma das mulheres mais inteligentes e charmosas que passaram pela minha sala de aula, Maria Cristina Andrade Vieira, estava bem ali na minha frente entoando um canto de sereia que deixaria qualquer homem se beliscando de felicidade. Mesmo antes de ter sido presidente da Associação Comercial do Paraná, por causa de sua sólida formação acadêmica e domínio dos mais diferentes temas contemporâneos ela era constantemente requisitada por platéias femininas para proferir palestras. E uma das teses mais interessantes que ela defendia nas suas apresentações é a de que já havia passado o tempo em que a mulher precisava erguer a espada e sair bradando pelos quatro cantos que era competente, que tinha as mesmas condições que o homem, e em muitos casos que era até mais bem preparada do que ele, pois essa verdade, salvo opinião contrária de alguns cabeças duras que parecem continuar habitando as cavernas, ninguém mais contesta. De acordo com sua opinião, a mulher precisaria aprender a abrir o coração e entender que, por causa da posição de destaque que as mulheres conquistaram na sociedade moderna, o homem transformou-se num ser frágil e desamparado. E, depois de provar que nós homens estamos numa pindaíba de fazer dó, conclamava suas parceiras para uma nova revolução – dizia que se elas não agissem com inteligência e sensibilidade para perceber essa condição masculina vulnerável, as relações entre homens e mulheres poderiam ficar seriamente abaladas.

Rapaz, nós que temos levado bordoada das mulheres de todos os lados, precisávamos, pelo menos uma vez na vida, ouvir essa mensagem tão compreensiva e acolhedora. E veja que a proposta é de uma revolução para nos pegar no colinho, ouvir com o coração nossas angústias de machos feridos e nos recolocar no rumo certo! Fale a verdade, não é música agradável de se ouvir?!

Pode dar encrenca, mas…
Se fosse um de nós fazendo essa pregação, o mundo viria abaixo. Provavelmente o comentário mais benevolente resvalaria no fato de que somos uma cambada de folgados, aproveitadores e chorões. E não tenho ilusões, pois mesmo dizendo que essa idéia partiu de uma mulher inteligente e bem preparada, só o fato de ser eu um homem a retransmitir a mensagem com as mesmas vírgulas que ouvi, na certa já vai dar algum tipo de encrenca.
Quando fui entrevistado para as páginas amarelas da revista Veja, uma das perguntas da jornalista Daniela Pinheiro fazia referência à comunicação das mulheres. Eu respondi usando exatamente as informações que as executivas que freqüentam meu curso me passam: “Se elas falam para uma platéia essencialmente feminina, podem vir a ser alvo de inveja e desprezo. Se falam só para homens, eles podem eventualmente não acreditar que elas sejam realmente capazes. Infelizmente, pelo menos na hora de falar em público, a barreira para as mulheres ainda é maior do que para os homens”. Nenhuma opinião minha, só o que elas mesmas dizem. Não deu outra, um montão de cartas descendo o pau e me chamando de machista.

Funciona mais ou menos como os comentários que fazemos sobre os nossos filhos. Os pais podem falar que o filho é um vagabundo, que não quer saber de estudar, que só pensa em ficar grudado no telefone perdendo tempo com conversa fiada e tantos outros elogios dignos de arrebentar com qualquer auto-estima. Mas, vai o vizinho ou o tio se atrever a mencionar só um desses adjetivos – é amizade rompida na certa!
Sem contar que nessa história de encrenca há um outro ingrediente – o humor feminino instável, pois para mudar de humor as mulheres também são mais competentes que nós homens. E antes que me ataquem por esse discurso atravessado, esclareço que mais uma vez estou respaldado em comentários de outra mulher e avalizado por pesquisas científicas. Em matéria publicada na Revista da Folha sobre os pontos fracos das mulheres, Lia Bock discute quais são os comentários verdadeiros e os que se baseiam apenas em lendas; e como é uma mulher escrevendo, lógico que a expressão “lenda” foi complementada por “intriga da oposição”. Segundo suas explicações fundamentadas nos ensinamentos do dr. Antônio Roberto Chacra, que atua como professor de Endocrinologia na Universidade Federal de São Paulo, o humor da mulher é instável porque “na adolescência, ela tem a primeira grande mudança hormonal, na gravidez a segunda, e na menopausa a terceira.
Isso sem falar nas variações que acontecem mês a mês por causa do ciclo menstrual”. Vixi! Quase parei por aqui depois desse alerta do dr. Chacra.

Preparando minha trincheira

Talvez a tese da Maria Cristina não chegasse a considerar uma idéia que tenho defendido sobre a condição do homem e da mulher na sociedade atual, e que tem muito a ver com essa nossa situação enfraquecida, quase à beira de um precipício (sem drama, companheiro, só estou me atendo aos autos). Por maior que seja meu cuidado ao expor os argumentos na defesa dessa teoria nunca consigo encontrar eco entre as mulheres. Entretanto, já que estamos nos valendo da opinião de uma mulher para constatar nossa fragilidade, não custa nada aproveitar para fazer mais uma tentativa.
A idéia polêmica é bastante simples: a mulher tem o mesmo direito e a mesma competência que o homem, mas culturalmente não sofre a mesma pressão social. Quando faço essa afirmação, independentemente do que essa mensagem queira significar, e antes de qualquer outra explicação que eu possa dar, percebo rapidamente no semblante delas o levantar de sobrancelhas como se dissessem: só quero ver aonde esse cara vai chegar com essa conversinha mole. E cá entre nós, também encontro até a resistência de alguns marmanjos sempre solidários às causas femininas, sejam lá quais forem. Só para citar um exemplo, o Max Gehringer me contou que há pouco apareceram uns fazedores de média querendo dar uma de politicamente corretos, propondo que Deus passasse a ser chamado de God/ess. Durma-se com um barulho desses! Também não dá para brincar com coisa séria e revelar pela ironia um preconceito que sem querer foi cultivado anos a fio, como o Lula que disse para as mulheres, imaginando que se tratava de um elogio: “Vocês são a maioria da população brasileira, já têm cargo de vereadoras, de prefeitas, de governadoras, e espero que não sejam desaforadas e comecem a pensar logo em ser presidente da República”. Lógico que foi uma brincadeira, mas não teve jeito, só faltaram queimar os sutiãs em praça pública.

A tese polêmica
Feitos os preâmbulos todos e já imaginando algumas unhas em posição de ataque, deixe-me explicar melhor essa heresia, que se não servir para convencer ninguém, poderá ser útil ao menos para uma reflexão sobre o tema, ou até mesmo como um tiro que sai pela culatra para fornecer um pouco mais de munição aos que desejarem me contestar.
Vamos imaginar que você seja casado com uma mulher (do jeito que as coisas andam é sempre oportuno esclarecer que é com uma mulher) que também trabalha e que a grana dos dois ajude a levar uma vida mais confortável, mas que a de um só também não os deixasse na rua da amargura e desse para defender o sanduba nosso de cada dia. Se a sua mulher, depois de avaliar bem a situação, chegasse para você dizendo que concluira ser muito mais conveniente para todos se ela deixasse o emprego e passasse a se dedicar exclusivamente à casa e aos filhos, a galera iria estranhar um pouco, mas não haveria comoção nacional. Agora, se fosse você a tomar essa iniciativa e chegasse dizendo que estava pedindo demissão da empresa e que dali para frente seu negócio seria apenas cuidar da casa e dos filhos, o mundo passaria por um novo dilúvio.
Percebeu a diferença, amigo? A mulher conquistou todos os direitos para disputar até com mais competência os mesmos espaços que nós, mas a sociedade não lhes impõe as mesmas obrigações. Assim, se a mulher resolver deixar de trabalhar e fazer o que lhe der na telha, as pessoas irão encarar essa atitude com naturalidade como sendo uma opção dela de tocar a vida. Já, nós homens não. Se ficarmos desempregados, trabalhando em casa, por um tempo maior do que o razoável, seremos tachados de vagabundos e correremos o risco de ter nossa reputação despencando sem termos onde segurar. Considere também que enquanto elas reclamam e exigem cada vez mais direitos, estão se preparando muito melhor do que nós – basta ver o vertiginoso crescimento do número de mulheres que freqüentam as universidades. As estatísticas não mentem, as moças tomaram conta. Veja só estes números:
No ensino médio enquanto os homens correspondem a 46% das matrículas, as mulheres já chegaram aos 54%. Na faculdade a diferença entre homens e mulheres que era de 8,7% em 1996, pulou para 12,8% em 2003. Quer mais? O número de homens docentes nas universidades aumentou 67,9% de 1996 até 2003. Excelente, desde que não se considerem os números conquistados pelas mulheres, pois nesse mesmo período o aumento delas foi de 102,2%. E a sova não pára por aí, o aumento de homens docentes com mestrado cresceu 106,1%, o número de mulheres com essa titulação aumentou em 119,4%. Ah, Polito, você está revelando os números referentes aos docentes com mestrado porque não quer falar dos docentes com doutorado só para distorcer a estatística? Pois então segura lá: o número de docentes homens com doutorado cresceu 69,2%. Sabe o que ocorreu com o número correspondente às docentes? Aumentou 104%.
Não dá para comparar. Qualquer dado estatístico que seja observado, enquanto nós homens andamos, elas estão correndo ou voando. Além disso, sempre tiveram algumas qualidades das quais, por melhores que venhamos a ser, estaremos a anos-luz de distância. Só para citar algumas que nos derrotam por goleada: sensibilidade, intuição, organização, controle à dor e ao sofrimento. E nós aqui em berço esplêndido, achando que o mundo é nosso. Até aqueles que enaltecem as mulheres com discursos politicamente corretos, falando das qualidades e das conquistas femininas, repudiando as injustiças que são cometidas contra elas, no fundo pensam que é tudo produto de retórica, mas que na verdade os homens ainda levam vantagem. Um exemplo de que a teoria na prática é outra e que na hora do confronto os homens apelam, ocorreu num jogo de futebol em que o Corinthians com um time recheado de “galácticos” perdeu a partida para o São Paulo. Sabem de quem foi a culpa? Do juiz. Até aí tudo bem, pois de cada cinco derrotas pelo menos umas três talvez sejam creditadas a “Sua Senhoria”. Só que nesse caso foi da Juíza. Silvia Regina de Oliveira apitou o jogo e se teve alguma falha não foi diferente dos erros que a maioria dos juízes cometem. Os perdedores não perdoaram, foram buscar estudos científicos para comprovar que mulher não tem a mesma competência física que os homens e, por isso, elas não conseguem acompanhar as jogadas de perto. Ocorre que nas avaliações físicas a que os juízes são submetidos ela sempre foi aprovada em 99% dos quesitos. Ou seja, é tão competente quanto os homens, mas precisa se defender de críticas infundadas pelo fato de ser mulher. E não é só nas atividades profissionais que elas nos passaram a perna ou estão a um passo de cruzar a linha da vitória. Hoje em cada quatro famílias brasileiras uma é chefiada pela mulher. E todos esses números estão crescendo numa proporção impressionante. E antes que você pense que estou me contradizendo, é bom esclarecer que nesses lares chefiados por mulheres normalmente não há um homem por perto cuidando dos filhos e fazendo comida. Por onde você olha tem um batom dando as cartas. As grandes corporações, que se preocupam com lucros e resultados, não se importam se no registro de admissão dos CEOS o quadradinho é preenchido por um M ou por F. Desde que haja expansão e venham os dividendos, tanto faz ser um homem ou uma mulher – e se tanto faz, lá estão elas na ponta da pirâmide.
Mas essa é uma conversa nossa, pois elas sabem como argumentar para nos convencer dos motivos que as levam a optar pela vida profissional ou pelos compromissos familiares. Minha amiga Amália Sina, uma dessas mulheres vencedoras, no seu mais recente livro Mulher e trabalho, publicado pela Editora Saraiva, justifica com inteligência e sabedoria em que condições as mulheres podem deixar o trabalho e escolher o lar: “O trabalho que sempre fez parte da vida da mulher, desde nossos mais distantes ancestrais, agora é parte do ser mulher. O trabalho externo ao lar. Ainda existem, sim, aquelas que preferem seu papel tradicional, de esposa e mãe. É, também, um trabalho. E em muitas frentes. Antes de tudo pedagógico. Mas, também de liderança – e sabemos todos que mãe é uma presença fundamental na vida de cada um de nós. E esposa também. Na Idade Média, período que se costuma chamar de ‘era das trevas’, as mulheres que se casavam com reis tinham status importante. Seu papel não era meramente decorativo. Elas eram conselheiras e co-participantes no governo dos súditos.”
Adianta discutir? Elas podem tudo e sabem como esclarecer com palavras o que desejam e o que precisam fazer. E nós aqui iludidos de que estamos no comando e que podemos decidir o rumo quando bem entendermos. Parecemos aqueles viciados em cigarro. Sempre dizem que fumam porque gostam e sentem prazer, mas que na hora que desejarem parar não terão nenhum problema. Só descobrem que são incompetentes para essa decisão “tão simples” quando resolvem deixar o cigarro e não conseguem.
Não, parceiro, nada de comodismo, pois a concorrência com elas é cada vez mais pesada e, que ninguém nos ouça, como vimos, por circunstâncias até da própria natureza. Confie em mim, tenho autoridade nessa praia. Dos meus quatro filhos três são mulheres, moro com minha esposa e minha mãe, tenho uma neta e mantenho bom relacionamento com a ex-mulher e com a ex-sogra. Mais de 60% dos funcionários da minha empresa são mulheres.
Por isso, vamos esquentar a água, caprichar na espuma, deixar a barba de molho, apoiar essa revolução feminina e, em benefício do bom relacionamento com o sexo oposto, aceitar essa condição de que somos seres mais frágeis, para que possamos pleitear sem constrangimentos nosso direito de ter um colinho mais acolhedor e compreensivo das mulheres. É só um pequeno empurrão porque, para nossa sorte, as meninas já se tocaram há um bom tempo de que se insistirem numa guerra com os homens e não nos tratarem bem, depois da contenda, ao contar os mortos e feridos no campo de batalha, elas também terão dançado. Ou seja, esse tipo de embate não dá camisa para ninguém.
E agora uma dica de quem já deu muito murro em ponta de faca – procure algumas aliadas e deixe que elas propaguem a nossa causa, pois, se ousarmos dar a cara para bater, e insistirmos em ser os próprios arautos do nosso pleito, vamos apanhar muito, e o colinho, que é o nosso maior objetivo, necas de pitibiribas.

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