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02 maio 2024

Apresentando Palestrantes

por Reinaldo Polito

Quando publiquei o livro Técnicas e segredos para falar bem pelo IOB, como atividade de lançamento fiz palestras em todas as capitais do País. A primeira delas foi no Rio de Janeiro. Chegando ao local da palestra, como sempre faço, verifiquei se todos os detalhes haviam sido preparados de acordo com as necessidades da apresentação: equipamentos, fios de extensão, voltagem da eletricidade, posição da tela, tipo de microfone, enfim, se o auditório estava pronto para ser usado. Testei o som, o aparelho de projeção, e andei sobre o palco para observar até que ponto poderia locomover-me sem atrapalhar a visão da platéia quando os visuais fossem projetados. Tudo em ordem, nada fora do lugar. Último item – quem fará minha apresentação? O responsável pelo evento disse que tudo havia sido providenciado e que um importante político já estava com meu currículo, só aguardando o início do evento.

Para minha desgraça, esse tal político não tinha a mínima idéia de quem eu era e qual seria o assunto da minha palestra. Resolvera aceitar a tarefa de me apresentar apenas para poder falar e aparecer diante daquela platéia lotada, com quase mil pessoas. Não acertou nada. Disse que a palestra seria sobre motivação e que o grande palestrante, conhecido em todo o território nacional (exceto por ele, que não sabia sequer onde estava a ponta do próprio nariz), era o Professor Alfredo Hipólito.
Lógico que a vontade era iniciar a palestra dizendo que Alfredo Hipólito era a avó dele, mas essa atitude deve ser reprimida com todas as forças. Nada de brigar com o apresentador que mete os pés pelas mãos e troca o tema da palestra ou o nome do palestrante. De maneira geral, ele faz parte daquela comunidade e, se foi encarregado da sua apresentação, provavelmente tem representatividade no grupo. Por isso, nada de confusão com ele. Lembre-se de que o desconforto nesses episódios é seu e de que a platéia, embora possa achar estranha a apresentação que foi feita, na realidade está ali para ouvir sua palestra.

Antes de sugerir alguns caminhos para você se sair bem, se o apresentarem de maneira inadequada, deixe-me contar como foi que resolvi a história do Alfredo Hipólito.
Agradeci as palavras ao apresentador e fiz um elogio sincero à voz bonita que ele tinha. Realmente era uma voz de barítono, sonora e bastante melodiosa. Depois, ainda sendo verdadeiro, disse que há poucas semanas, ao fazer uma palestra em Recife, o organizador do evento me havia confidenciado que ao receber o programa e ler o meu nome não se cansava de dizer para si mesmo: “Polito, Polito, eta nominho esquisito. Mas, por ser estranho, jamais irei me esquecer do nome desse palestrante, Reinaldo Polito”. Deu certo. Fiz o comentário a respeito do sobrenome e, de passagem, corrigi também o nome. Sem constrangimentos pude fazer a minha palestra.

Previna-se contra os desastrados

Daqui a pouco vou falar sobre como contornar a desgraça, mas se você tomar alguns cuidados preliminares os problemas poderão ser evitados.

Prepare você mesmo sua apresentação

Por que confiar no bom senso da pessoa que fará sua apresentação, supondo que ela incluirá exatamente as informações que você deseja ouvir? Tome a iniciativa de redigir você mesmo sua apresentação, com a certeza de que serão mencionados apenas os dados que julgar adequados.E, se posso dar um conselho de bastidores, mande as informações para o responsável pelo evento e tome o cuidado adicional de levar uma cópia consigo no dia da apresentação. De vez em quando, esses dados desaparecem como que por encanto e, quase sempre, ao invés de entrarem em contato para pedir as informações novamente, talvez por constrangimento, tomam a iniciativa de pesquisar na internet ou em outros documentos que tinham à mão, e lá estará você sendo apresentado com os dados desatualizados, ou inadequados para aquele evento. Assim, ao chegar ao local do evento certifique-se de que o texto que será usado para sua apresentação é exatamente o mesmo que você encaminhou. No caso de haver divergências, substitua.

Falando em dados para sua apresentação, cuidado para não exagerar e incluir tudo o que lhe vier à cabeça. Mencione apenas as informações que mostrem sua experiência e formação para aquele assunto a que se propôs abordar. Nada de dizer que foi campeão universitário de xadrez se o seu tema for “Técnicas modernas de pavimentação”, por mais orgulho que tenha desse título conquistado. Mesmo que as informações sejam pertinentes, mantenha-se precavido e não exagere nos detalhes que poderiam ser suprimidos. Lembre-se de que não é currículo para emprego ou para qualificação em programas de doutorado. Trata-se apenas de mostrar que você tem credenciais e autoridade para falar sobre o assunto.

Mas, e a desgraça?

Agora posso falar sobre as apresentações inconvenientes – eu ia dizer inadequadas, mas inconvenientes parece traduzir melhor esses episódios desastrados.
Seria difícil relacionar todas as impropriedades que alguém poderia cometer ao fazer a apresentação de um palestrante, mas essas que vou mencionar serão suficientes para que você fique esperto e atento para uma “saída pela direita”:

O apresentador combina um texto com você e na hora resolve improvisar e muda o que foi acertado.

Toma a liberdade de ser engraçadinho e menciona algum deslize que você cometeu no passado, como uma bebedeira, ou o fato de ter perdido a hora para um compromisso importante.

Erra seu nome ou o pronuncia de forma incorreta.

Confunde o título da palestra e anuncia um assunto diferente.

Imagina que pode fazer outra palestra antes da sua.

Normalmente, com os cuidados que foram sugeridos há pouco, a sua apresentação deverá ser feita de maneira adequada, por isso, não imagine que sempre ocorrerão problemas. Apenas fique atento para que eles não aconteçam.

O apresentador combina um texto com você e na hora resolve improvisar e muda o que foi acertado.

Talvez esse seja o maior de todos os riscos, pois é impossível vigiar o que se passa na cabeça das pessoas. Nessas circunstâncias, com muita gente na platéia, pode ocorrer uma crise de estrelismo e o cidadão resolver explorar uma capacidade de comunicação que julga possuir. E lá estará ele diante do público com o semblante iluminado pela oportunidade de mostrar seus dotes de excelente improvisador. Para seu desespero, ele dobra a folha com o currículo que deveria ler, tira o microfone do pedestal e se aproxima dos ouvintes para promover melhor interação com o grupo. Como ele diz o que julga que deveria falar, e não o que foi combinado e, portanto, seria apropriado para o evento, acaba se atrapalhando e transmitindo incorretamente a mensagem. Bem, se você se colocou no lugar no lugar do palestrante,deve estar vermelho de raiva e querendo se vingar do imbecil.
Calma, tigrão. Recorde-se de que não é uma boa política arrumar encrenca com o apresentador, por todos os motivos já comentados. Sua preocupação nesse momento deve ser apagar o incêndio e criar condições favoráveis para fazer bem a palestra.

Sem demonstrar contrariedade, sem fazer comentários irônicos ou agressivos, agradeça as palavras do orador e, com jeito, faça as correções. E, desde que seja possível, assuma para si os deslizes cometidos e promova a transição da apresentação para a palestra. Se o conteúdo anunciado fizer parte de algum item da palestra, aproveite para mostrar que além daquele aspecto mencionado você pretende ampliar um pouco mais o assunto e tratar do tema de maneira mais abrangente. Nesse momento, você terá condições de dizer como será sua palestra.
Se, entretanto, o “Demóstenes de botequim” anunciou um conteúdo que não tem nada a ver com sua palestra, diga que na verdade o que você deveria ter informado, ou esclarecido ao apresentador é que sua intenção é falar sobre… E aí faz a correção.
Assim, com elegância e diplomacia será possível redirecionar o rumo que era tortuoso e fazer os acertos necessários.

Toma a liberdade de ser engraçadinho e menciona algum deslize que você cometeu no passado, como uma bebedeira, ou o fato de ter perdido a hora para um compromisso importante.

Agora é que você não pode demonstrar contrariedade, por mais inconveniente ou até mesmo vulgar que tenha sido o comentário. Uma saída espirituosa talvez seja a melhor solução nessas situações. Se por acaso ele exagerou no comentário, apenas com o objetivo de ser engraçado, você poderia desmenti-lo com sutileza, usando também a presença de espírito. Por exemplo, dizer que o apresentador fez esse tipo de comentário porque sabe que em algumas palestras você bate pesado contra a bebida e a falta de pontualidade.
Bem, e se o fato for verdadeiro? Nessa circunstância, assimile o golpe, arrependa-se mentalmente de ter aceitado aquele idiota como apresentador e brinque com a situação, procurando diminuir o impacto da informação. Por exemplo, poderia dizer que com amigos como esse nunca precisará de inimigos (essa é velha, mas ainda funciona).

Depois do comentário é importante reformular a introdução com uma auto-apresentação, mencionando as informações que sejam importantes para a palestra e fazer a transição para o conteúdo da exposição. Essa não é uma situação muito comum, mas não estamos imunes a ela – idiota e resfriado aparecem quando menos se espera. O fato que vou relatar não ocorreu em uma apresentação, mas guarda as mesmas características do estudo que acabamos de fazer.
Um juiz, aluno do nosso curso de expressão verbal, contou que, quando trabalhava em uma comarca no interior de São Paulo, passou por uma situação muito curiosa. Como juiz, precisava interrogar uma testemunha para saber se o réu costumava beber muito. Disse que, como a cidade era pequena, as pessoas se conheciam e sabiam dos hábitos dos moradores da localidade. Relatou que o diálogo foi mais ou menos este:
— Gabriel, diga com sinceridade, o João costuma beber muito?
— Olha, doutor, pra ser sincero, ele bebe que nem nóis assim.
Ao ouvir essa resposta, o juiz rapidamente intercedeu para que não pairasse dúvida com relação à sua própria conduta:
— Que fique consignado nos autos que o réu bebe mo-de-ra-da-men-te.

Erra seu nome ou o pronuncia de forma incorreta

Sugiro que considere alguma peculiaridade do seu nome e analise que tipo de incorreção poderia ocorrer e prepare antecipadamente algumas saídas para o caso de ser apresentado de forma inadequada. Naquele meu exemplo da palestra no Rio de Janeiro já dei algumas indicações de como esse erro pode ser contornado.

Confunde o título da palestra e anuncia um assunto diferente

Essa é uma situação mais simples de ser contornada, pois bastará fazer a correção com pequenos comentários complementares, como, por exemplo: “Além do tema que foi anunciado falarei também sobre…”. Ou, se ele fugir muito do objetivo da palestra, dizer: “Esqueci de informar ao apresentador que hoje abordarei o assunto por um ângulo diferente, irei falar sobre…”. Ou, se julgar ainda mais conveniente, dizer: “Embora o tema anunciado tenha sido…, na verdade hoje vou falar sobre…”.

Imagina que pode fazer outra palestra antes da sua

Essa é a situação em que o apresentador já vai preparado para falar. Estuda o assunto como se ele é que devesse fazer a palestra. E em casos mais graves a fonte de pesquisa é a sua e, por isso, antecipa vários tópicos da sua exposição. Vejamos como esse carona de tribuna poderia falar e quais as atitudes que você deve tomar:

Fala exatamente o que você iria expor, de acordo com sua linha de pensamento. Nesse caso, agradeça as palavras ao apresentador e use um dos tópicos que ele abordou e efetue de maneira natural a transição para o início da palestra. Não se preocupe em demonstrar que possui mais conhecimento do que seu apresentador, afinal, você foi convidado para falar e é a autoridade no assunto. Poderá ainda, se julgar oportuno, fazer uma ou outra referência às palavras do apresentador, como se estivesse aproveitando uma circunstância e desenvolvendo o raciocínio naquele instante. Essa atitude produz forte impacto na platéia.

Fala o que você iria expor, mas contraria alguns conceitos que pretende defender na sua exposição. Por mais delicada que seja essa situação, não inicie refutando as opiniões contrárias. Agradeça as palavras ao apresentador e faça sua palestra normalmente. Apenas tome o cuidado de anotar, mesmo que mentalmente, os pontos com os quais discorda e inclua esses tópicos na sua exposição, e, sem demonstrar que está digladiando com ele, deixe claro seu pensamento.

Como apresentar um palestrante

Depois de ter estudado o lado do palestrante, agora está mais simples analisar o papel do apresentador:

Peça que ele forneça o currículo

Ao receber o currículo das mãos do próprio palestrante terá a certeza de que todas as informações mencionadas estarão corretas e de acordo com a vontade dele.

Confirme o nome, a pronúncia e a forma de tratamento

Certifique-se com o próprio palestrante ou com alguém da assessoria dele com qual nome ele deseja ser chamado. Algumas pessoas possuem muitos nomes e adotam apenas dois ou três deles. Se você tomar a iniciativa de escolher os nomes que deveriam ser usados poderá errar. Não confie na sua experiência julgando que sabe qual é a pronúncia correta do nome, pois poderá se surpreender com as informações que receber do palestrante.
É importante também saber se ele gosta de ser tratado por professor, doutor, ou se tem preferência por alguma outra forma de tratamento. Após ter tomado essas precauções, um bom roteiro para apresentar palestrantes é este:

Fale sobre o motivo do evento

É importante que as pessoas saibam por que estão naquele evento. Por exemplo, há algum tempo fiz uma palestra em Araraquara, no interior de São Paulo, sobre como falar em público promovida pelo Núcleo Escola de Inglês. O apresentador explicou que o evento denominado Panorama by Núcleo era promovido anualmente pela escola de inglês com o objetivo de oferecer programas culturais à comunidade. Em poucas palavras esclareceu à platéia o motivo do evento.

Fale sobre a importância do tema

Você já sabe que falar sobre a importância do tema não significa fazer a palestra no lugar do palestrante. Fale apenas o suficiente para deixar os ouvintes mais interessados na palestra. Para saber o que deverá ser comunicado nesta etapa, basta que reflita sobre os motivos que levaram os organizadores do evento a convidar aquele palestrante para tratar daquele assunto.

Fale sobre o palestrante

Nesta etapa será suficiente falar da sua satisfação em apresentar o palestrante (às vezes, essa informação pode ser transmitida logo no início) e ler o currículo dele. É sempre simpático dizer que se trata de um resumo das qualificações do palestrante, e nunca, em nenhuma hipótese, diga que foi ele quem forneceu o currículo.

Convide o palestrante para falar

Nesta última etapa da apresentação vá aumentando gradativamente o volume da voz e a velocidade da fala com o objetivo de tornar a platéia mais receptiva para a chegada do palestrante: “E para falar sobre a importância da terapia do riso convidamos para ocupar a tribuna a Doutora Marta Paone Calmon”.
Inicie os aplausos e dê o exemplo prestando atenção à palestra.

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