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04 abr 2018

Riscos e armadilhas das citações

Na última semana escrevi sobre o uso de pensamentos, máximas, provérbios e citações http://economia.uol.com.br/planodecarreira/artigos/polito/2009/02/23/ult4385u97.jhtm. Vou denominá-los todos como citações. Alertei para o fato de que o assunto é controvertido. Não deu outra – recebi uma grande quantidade de e-mails de pessoas dizendo que são contra e de outras afirmando que são favoráveis a esses recursos.

 

Fiquei admirado com um leitor, Rubens Costa. Ele me enviou duas mil citações, de excelente qualidade, que colecionou com paciência e critério ao longo dos anos. Um trabalho muito interessante, que poderia ter grande utilidade se publicado em livro. Ele me garantiu que irá publicar.

 

Não me surpreendi com a reação dos leitores. Embora tenha deixado claro que o equilíbrio é a medida desejável para o uso das citações, alguns escreveram para dizer exatamente o que eu havia dito – que o excesso delas pode prejudicar a qualidade da comunicação.

 

Vejamos algumas opiniões que se confrontam e que, por isso, podem nos auxiliar a refletir melhor sobre o assunto. Vou começar citando a opinião de Jules Lemaître, que é contra o uso das citações: ‘Os pensamentos e máximas são um gênero esgotado e um gênero fútil’.

 

Por outro lado, há aqueles que fazem a apologia das citações, como, por exemplo, Eno T. Wanke, ao afirmar em Pensamentos Moleques: ‘os provérbios são telegramas que os antigos nos deixaram para nos transmitir notícias de sua sabedoria’.

 

Paulo Rónai, no prefácio do seu Dicionário Universal Nova Fronteira de Citações inicia suas considerações com uma frase de Machado de Assis: ‘sentenças latinas, ditos históricos, versos célebres, brocados jurídicos, máximas, é de bom aviso trazê-los contigo para discursos de sobremesa, de felicitação e de agradecimento’.

 

Feitas as considerações contrárias e favoráveis, deixo aqui minha opinião como professor de oratória – gosto das citações e recomendo seu uso. Desde que não haja excessos, que se observem os riscos das inadequações (pensamentos que não guardam interdependência com o conteúdo), que se afastem autores controversos (autores polêmicos, que podem enfraquecer a credibilidade da mensagem).

 

Outra questão que precisa ser avaliada é o uso abusivo de um mesmo pensamento ao longo do tempo.  Acaba se transformando em chavão, em frase feita. Houve uma época em que o humorista Chico Anysio interpretava uma personagem que reagia de forma curiosa ao uso de chavões. Ele não admitia que alguém usasse frases feitas ou lugares-comuns.

 

Todas as vezes que a pessoa iniciava com a pérola batida, como por exemplo – água mole em pedra dura… – ele interrompia dizendo: não vai me dar uma dessa, você não vai me dizer que é aquela história de água mole em pedra dura tanto bate até que fura?

 

Esse exagero do humorista indica bem o efeito que os chavões e as frases feitas podem produzir. Embora possam até representar um pensamento profundo, acabaram se desgastando pelo uso excessivo e deixaram de provocar admiração. A saída é colocar uma roupagem nova sobre as velhas idéias e torná-las atraentes.

Portanto, evite frases como: quem não se comunica se trumbica, o sol nasceu para todos, a união faz a força, uma andorinha só não faz verão, e outras preciosidades da mesma família. Ou, se resolver usá-las coloque uma roupagem diferente, que dê a impressão de se tratar de uma novidade. Como disse Unamuno: ‘Repensar os lugares-comuns mais surrados é a filosofia mais profunda e o único modo de apagar-lhes o malefício’
Algumas frases produzidas por autores renomados e que conquistaram reputação excepcional também foram usadas com tanto excesso que acabaram se vulgarizando, como por exemplo, ‘tudo vale a pena quando a alma não é pequena’ de Fernando Pessoa, e a não menos votada ‘tu te tornas eternamente responsável por tudo aquilo que cativas’ de Saint Exupéry, usada por onze entre dez misses do mundo inteiro. A não ser excepcionalmente, quando o contexto quase exigir a utilização de alguma delas, deixe-as de lado.

 

Superdicas da semana:

– Ponha uma roupagem nova sobre as velhas citações

– Evite o chavão e as frases vulgares

– Observe se a citação é adequada ao conteúdo

– Afaste citações de autores polêmicos ou de reputação duvidosa

 

Para ver outras dicas entre no meu site https://reinaldopolito.com.br/portugues/dicas.php?id_nivel=15

 

Livros de minha autoria que tratam desse tema: “Como falar corretamente e sem inibições”, “Assim é que se fala” e “Superdicas para falar bem” (também em audiolivro), publicados pela Editora Saraiva.

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